Rio - Homens do Exército realizam na manhã desta quinta-feira revista a moradores do Complexo do Alemão na Zona Norte. Carros, comércios e pedestres são parados pelos militares. A imprensa não foi autorizada a acompanhar o trabalho dos soldados.
De acordo com o major Bouças, porta-voz da Força de Pacificação, toda a ação é filmada e fotografada. O objetivo é resguardar os militares em caso de possíveis reclamações de moradores. Cerca de 150 homens das polícias militar, civil e Exército participam da operação, que visa cumprir mandado de busca e apreensão na comunidade.
A Defensoria Pública é esperada nesta quinta na comunidade para garantir os direitos dos moradores da região.
Como O DIA publicou com exclusividade, a juíza do plantão judiciário de sábado, Renata Palheiro Mendes de Almeida, expediu mandados de busca e apreensão genéricos que autorizavam os militares a vasculharem casas em 29 pontos da comunidade em busca de armas e drogas até domingo. A operação do Exército na terça-feira assustou moradores com mensagem em carro de som, orientando a população a agir com educação. “Qualquer ação contrária será considerada como ato hostil e receberá a resposta necessária”, dizia.
Operação do Exército na terça-feira na Pedra do Sapo| Foto: Maíra Coelho / Agência O Dia
“A decisão fere as garantias constitucionais. Vou aos locais amanhã (quinta-feira), pois só posso entrar com um mandado de segurança baseado na reclamação de moradores”, afirmou Luís Felipe Drummond, assessor criminal da Defensoria. O defensor pretende pedir acesso às duas decisões na Justiça que autorizaram a ação dos militares.
O juiz João Batista Damasceno, integrante da Associação Juízes para a Democracia, condenou a ação do militares e o Judiciário. “Essa medida é inconstitucional e os militares estão agindo como marginais, porque estão à margem da lei. O Código de Processo Penal diz que o mandado deve indicar com a maior precisão possível a casa em que a diligência será feita e com o nome do morador”.
Na avaliação do magistrado, o Exército e o Judiciário cometeram arbitrariedade. “O Judiciário foi criado para garantir os direitos dos cidadãos e a polícia, a segurança. Se o Judiciário está com a polícia, quem vai garantir os direitos desses moradores?”, questionou. “Coisa pior só vi quando os juízes expediam mandados de prisão em branco na época da ditadura para que a Polícia do Exército os preenchessem com as informações de quem encontrassem”, contou.
Para o criminalista Antônio Gonçalves, nenhuma decisão judicial pode ferir a Constituição Federal. “Não se pode violar as garantias fundamentais por mera suspeitas”, criticou.
'Me senti ameaçada'
Nesta quarta-feira, dia seguinte à operação na Pedra do Sapo, a mensagem do Exército pelo alto-falante impondo regras de comportamento à população na terça-feira ainda repercutia no complexo. “Eu acho um absurdo. Um abuso. Sou trabalhadora e não quero ser tratada como suspeita”, indignou-se a doméstica Carla Gomes Silva. Uma dona de casa que preferiu não se identificar também fez críticas. “Foi assustador. Nunca tinha ouvido uma coisa daquelas. Me senti ameaçada”.
Na ação, drogas e armas foram apreendidas. Responsável pela Força de Pacificação do Complexo do Alemão, o general-de-brigada Cesar Leme Justo, da 9ª Brigada de Infantaria Motorizada do Rio de Janeiro, considera a mensagem incisiva, e não hostil. Ainda na avaliação do oficial, o texto não se refere ao toque de recolher.
“Convidamos a população ao recolhimento para que a proteção dela seja garantida em caso de confrontos. Estamos privilegiando ações de inteligência e nossa maior preocupação é preservar a integridade dos moradores”, ressaltou o oficial.
Mapeamento do tráfico
Fotos e filmagens da ação do tráfico delimitaram a área a ser vasculhada pelo Exército. Foi o que informou ontem a juíza Renata Palheiro Mendes de Almeida. Para expedir os dois mandados de busca e apreensão genéricos, a juíza alegou que foram mapeados 29 pontos no Complexo do Alemão.
Jipe com alto-falante orientando população sobre como agir deixou a maioria das ruas vazia no complexo | Foto: Maíra Coelho / Agência O Dia
Para a juíza, é impossível expedir os mandados dando endereço, pois as ruas são indefinidas e não há numeração nas casas. “A ação visou combater o crime organizado para livrar a população de uma possível retomada do crime. E o modo como foi executada não foi apreciado pela Justiça”, disse a magistrada.
Reportagem de Adriana Cruz, Angélica Fernandes e Maria Inez Magalhães
Nenhum comentário:
Postar um comentário