Herculano Barreto Filho
A Justiça concedeu habeas corpus ao coronel da PM Djalma Beltrami, ex-comandante do 7º BPM (São Gonçalo), na noite de sexta-feira. O oficial foi preso, no fim da tarde desta quinta-feira, em casa, em São João de Meriti, por uma equipe da Corregedoria Geral Unificada. O habeas corpus foi concedido pelo desembargador Antônio Carlos do Santos Bitencourt, do plantão judiciário.
Djalma Beltrami, logo após ser solto pela segunda vez Foto: Herculano Barreto Filho
Leia a íntegra da decisão abaixo:
PODER JUDICIÁRIO
ESTADO DO RIO DE JANEIRO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PLANTÃO JUDICIÁRIO
DECISÃO
Trata-se de habeas corpus liberatório com vista à revogação da prisão preventiva do paciente Djalma José Beltrami Teixeira impetrada pela ilustre defensora pública Drª. Cláudia Valéria Taranto.
Em apertada síntese fundamenta o pedido mandamental em ausência de requisitos suficientes para a atual prisão cautelar e que se ampararia em mesmos fundamentos de prisão temporária revogada pelo Segundo grau de jurisdição por decisão do eminente Des. Paulo Rangel, que na ocasião teria entendido frágil a indicação da autoria e desse modo também a necessidade da custódia "ad cautelam".
DECIDO.
Neste espaço de decisão liminar dispenso-me de digressões doutrinárias mais eruditas sobre a matéria, posto que já bem colocadas na própria impetração, todavia, assinalando que a prisão cautelar, seja ela qual for, tem por único fim o resultado do processo, e é para ele que existe a nível de excepcionalidade, dada a sua natureza de levar ao cárcere antecipadamente sem a afirmação da culpabilidade.
E só um termo explica isso: a necessidade.
São requisitos da cautela os chamados: fumus delicti comissi e periculum libertatis, que precisam estar concretamente demonstrados para legitimar e validar a prisão de um indivíduo qualquer, como exigência do Estado Democrático de Direito.
Para dizer que não citei ninguém, e sem o propósito de trair a afirmação inicial, faço referência a uma perplexidade dos doutrinadores:
"Toda prisão cautelar dever ser fundamentada, escorando-se em motivação suficiente a demonstrar a sua indispensabilidade. Não se trata de conveniência e nem de discricionaridade, mas de necessidade, a ser aferida do ponto de vista do verdadeiro perigo da demora.
O juiz brasileiro, enquanto cotinuar refém da fórmula prende ou solta determinda pelo nosso CPP, prossegurá na prática, sem controlo, de erros e acertos, inevitáveis nesse cenário.
Do contrário- e residem aí os problemas-corre-se o risco de se passar a uma política de esquizofrenia prisional..." (Comentários ao Código de Processo Penal e sua Jurisprudência, de Eugênio Pacelli de Oliveira e Douglas Fisber, 2ª edição, p. 370 a 671.)
E isso pode ocorrer quando se tem por ótica o perigoso "Estado Policial", onde direitos são solapados, acusa-se primeiro para depois provar, e expõe-se apressadamente a vida de uma pessoa ao repúdio social, e tudo isso sem a menor parcela de arrependimento, ou "mea culpa", porque o Estado investigativo tudo explica à semelhança da tenebrosa ficção de Orwell, em seu livro "1984".
A edição do jornal Extra desta data, já "ciente" do processo em segredo de justiça abre sua manchete sobre a matéria aqui apreciada, da seguinte forma: "Nova prisão, velhos indícios", e tem razão.
O juiz de primeiro grau que decretou a prisão deu magia a novas palavras, que passaram a ter a força de prender, dizendo ter surgido das escutas telefônicas, novas referências que comprometeriam o paciente, mas que continuam no perigoso terreno da suspeita, da conjectura, da perplexidade autoral.
Não se tem mais, segundo o juiz, apenas "01", mas outros qualificativos que entendeu definitivos como indicadores do paciente como um dos envolvidos na grande rede de corrupção, escandalosa por sinal, e que resultou de investigação por inquérito policial.
Surge como "fato novo" a referência a "comandante", "comando", "o que assumiu agora", "comandante maior", e que por essa nova ampliação de qualificativo, sem apontar sequer um nome, viu-se fundamento suficiente para entender que tudo estaria explicado, e daí temerariamente decretando a prisão preventiva do paciente.
Não existe nas escutas qualquer captação de voz atribuível ao paciente, o que certamente já seria um indício severo de seu comprometimento na malha criminosa. O que existe de concreto são diálogos de terceiro, que não mencionaram especificamente o nome do paciente para uma maior certeza indiciária de suficiência cautelar.
Como bem colocado pelo nobre Desembargador Paulo Rangel fica fácil, assim, no plano das ilações, chegar-se a qualquer um, desde que fosse simplesmente citado em conversa alheia suspeita e que, não se descarta a hipótese, possa ter sido artificialmente construída.
O ilustre juiz que decretou a prisão viu suficiência em meras referências que já existiam para entender como fundamento novo para o decreto da custódia, e que, não se foge disso, precisa estar resguardado pela ideia de necessidade da prisão, a qual não pode ser decretada por simples suspeitas da autoria, de que o réu vá se evadir do distrito de culpa, de que vá prejudicar a instrução criminal, ou mesmo para a garantia da ordem pública ou econômica, uma vez que todos esses itens são de exigência demonstrativa para dar legitimação a essa excepcional antecipação carcerária.
Especificamente sobre a autoria, a lei exige indício suficiente de autoria (art. 312 do CP).
O processualista Renato Brasileiro de Lima corretamente assim pondera:
"Não se pode confundir o indício, que é sempre um dado objetivo, em qualquer de suas acepções (prova indireta ou prova semiplena), com a simples suspeita, que não passa de um estado de ânimo (...) a suspeita é uma pura intuição ,que pode gerar desconfiança, dúvida, mas também conduzir ao engano." (Manual de Processo Penal, volume I, p 1317)
A prisão preventiva, na reprodução de uma temporária já decidida por grau superior de jurisdição por um desembargador que a contrariou, parodiando a citada manchete de jornal acima citada, mais nos lembra o conhecido "samba de uma nota só", onde se bate na mesma tecla ou corda, por fato novo apenas em razão dos anteriores, na verdade exatamente iguais, em permanente antiguidade.
A liberdade como bem extremamente valioso deve aqui ser garantida, sem prejuízo da persecução penal porque também não se pode tolher o estado-administração querer demonstrar a sua pretensão, mas desde que o faça dentro das regras teoréticas, empíricas e concretas (estas no agir da autoridade constituída, com respeito ao princípio reitor da dignidade humana).
Por tais fundamentos REVOGO liminarmente a prisão preventiva do paciente, determinando a expedição do alvará de soltura.
Des. Antônio Carlos dos Santos Bitencourt
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